Os Espaços Simbólicos da FTSA

OS ESPAÇOS SIMBÓLICOS DA FTSA EM SEUS 20 ANOS DE HISTÓRIA
Por Wander de Lara Proença

“Aos treze dias do mês de janeiro de 1994, reuniram-se quinze pessoas, na cidade de Londrina – PR, para deliberarem sobre a fundação da ACESA, bem como eleger a primeira diretoria e criar o Seminário Teológico Sul Americano. (…). A ACESA terá, como prioridade, a formação de obreiros através de seu Seminário, sem distinção de suas denominações de origem” (Extraído da primeira ata da ACESA – mantenedora da FTSA).

A FTSA nasceu no espaço físico de um colégio, cresceu no ambiente eclesiástico de uma igreja, consolidou-se em um local notabilizado pela presença de diversas instituições de ensino superior, para, finalmente, atingir um ambiente sem fronteiras. Um pouco desse percurso histórico e dos significados representacionais destas geografias, que estratégica e emblematicamente foram demarcadas pelo tempo, são destacados a seguir.

1. Teologia e educação no espaço de um colégio

O tradicional Colégio Londrinense, situado em área central da cidade de Londrina, faz parte da estrutura do Instituto Filadélfia, que tem raízes historicamente fincadas nos projetos da Sociedade Evangélica Beneficente, cujos ideais educacionais reportam-se aos tempos do professor Zaqueu de Melo, de notável memória e respeitabilidade no contexto norte-paranaense. Um dos fundadores da FTSA, Antonio Carlos Barro, lembra as razões que levaram à escolha do nome do novo seminário: “Como seria instalado no Instituto Filadélfia, inicialmente pensamos no nome Seminário Teológico Filadélfia. É um nome comum e ao mesmo tempo um nome extremamente evangélico e bíblico; essa era a idéia e a gente estava trabalhando nessa direção. Mas num certo dia, eu não me lembro porque, talvez tenha sido uma inspiração, eu chamei o Jorge [Jorge Barro] e disse para ele: ‘olha, muda tudo, não vai ser mais esse nome’. ‘Então qual vai ser o nome?’ – perguntou. ‘Seminário Teológico Sul Americano’ (STSA) – respondi. ‘Por quê esse nome?’ – insistiu. ‘Eu creio que esse nome expressa melhor aquilo que é a intenção nossa, que é ter uma teologia voltada para a realidade latino-americana e, especialmente, a brasileira’. E o pessoal gostou do nome e assim foi”.* Foi naquele ambiente educacional – cheio de vida, porque ocupado diariamente por centenas de crianças – que alunos, professores e funcionários do nascente seminário encontravam inspiração para imaginar e projetar sonhos maiores, sabedores de que grandes projetos divinos costumam surpreender o mundo pela simplicidade, como aquele que se originou em uma manjedoura de Belém (Lc. 2:16).

2. Teologia e espiritualidade no espaço eclesiástico

Eduardo Pellissier comenta sobre uma outra geografia da FTSA: “Após três anos, tínhamos que buscar outras instalações e assim iniciei a procura por um escritório… Foi alugada, no centro de Londrina, uma sala para funcionar o escritório, diretoria e secretaria. Mobiliamos e, quando estávamos nos preparando para levar as turmas para as igrejas, eu recebi a visita dos pastores da Primeira Igreja Presbiteriana Independente de Londrina. Então lhes comuniquei que nós estávamos saindo daquele local de origem, quando então nos perguntaram: ‘porque vocês não vão para o Espaço Esperança [amplas instalações daquela igreja, no centro da cidade]?’ Eu lhes falei: ‘eu não faria um pedido deste a vocês, pois há um seminário da IPI aqui em Londrina… acho que isto é anti-ético… Após uma semana, entretanto, eles retornaram ao escritório e nos disseram: ‘nós entendemos a visão de vocês, acreditamos nesta visão, e o conselho da Igreja, por unanimidade, está convidando o STSA para se instalar no Espaço Esperança.’ Eles nos cederam as salas e um espaço para a biblioteca, que na época era muito pequena. Mas o escritório do Seminário teve que ficar no centro da cidade, onde ficávamos todos juntos o dia inteiro. Assim, costumamos hoje relembrar que em 1998 ‘fomos todos para o Espaço’ – Espaço Esperança. Foi este um período muito marcante, pelo carinho que a igreja teve por nós. Nunca, nesses três anos em que lá permanecemos, tivemos qualquer desconforto com a igreja ou com o pessoal que diariamente também ocupava aquele espaço. Este foi um período muito abençoado”.* Essa presença do Seminário no ambiente interno de uma igreja tornou-se um referencial de que o ensino teológico não deve estar distante da realidade da igreja; ao contrário, precisa ocorrer na vivência da fé em seu ambiente mais original, que é a comunidade. Realizar aulas dividindo espaços com atividades de celebrações cúlticas, com ensaios musicais, reuniões de oração, no dia-a-dia do Espaço Esperança, serviu como uma experiência não apenas inspirativa a alunos e docentes, como também uma lembrança de que a teologia se faz no convívio e na caminhada junto com a igreja.

3. Teologia e ciência no espaço universitário

Luís Gonçalo Silvério resume bem esse tempo de percursos geográficos que a Instituição vivenciou: “A escola acabou sendo itinerante, montando barraca aqui, desmontado ali, até conseguir sua casa própria. Acho que os momentos mais marcantes desses anos de história foram: a criação, a itinerância, até a chegada à sede própria”.* Finalmente, no ano 2000 houve a mudança de local para a sede própria, situada na Rua Martinho Lutero, 277 – Gleba Palhano. Isso significou também inserção na região geográfica de Londrina em que se instalam importantes instituições de ensino superior. Além da Universidade Estadual de Londrina, que tem seu campus em espaço fronteiriço com o campus da FTSA, diversas outras faculdades e universidades particulares se concentram nesta parte sul da cidade. Antonio Carlos relata um episódio peculiar envolvendo o local em que se instalou a Faculdade:“Quando nós compramos esse terreno, tudo era um mato enorme e essas ruas não tinham asfalto ainda. Eu imaginava que elas não tivessem nome, não sabia se era rua A, B ou C. Eu pedi, então, para o Luís Silvério ir na prefeitura para colocar nome nestas ruas. Ele procurou no mapa e descobriu que na região todas as ruas já tinham nomes. E ele me disse: ‘você não tem nem ideia sobre os nomes dessas ruas’. Eu fiquei pensando: ‘só falta ser um nome absolutamente destoante da fé cristã… ou alguma coisa neste sentido’… E então ele acrescentou: ‘essas ruas aqui têm nomes e o nome da rua principal é Martinho Lutero, o nome da rua do lado é Ulrich Zuínglio, e o nome da rua do lado do fundo, João Knox’. Esses são nomes dos reformadores da igreja, pessoas importantes na história do Cristianismo. A gente só pode creditar tudo isso à mão de Deus; porque comprar um imóvel ladeado por três ruas de reformadores…”*

Naquele mesmo ano, a escola também deixou de ser Seminário para tornar-se Faculdade, obtendo a consolidação desse processo no ano de 2005, com o reconhecimento do curso de graduação em Teologia pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC). Como Faculdade, ampliaram-se mais ainda aqueles objetivos originais, tornando-a cada vez mais sólida no ambiente acadêmico e missionário para dar continuidade à história dos primeiros tempos. Houve de igual modo a ampliação dos cursos. Até o ano de 2000, havia um curso de Bacharelado e dois programas de mestrado; até 2003, três programas de bacharelado, três programas de pós-graduação diferentes: mestrado acadêmico, mestrado profissionalizante, doutorado em ministérios e também cursos de lideranças leigas, além de muitas parcerias com outras instituições. A partir de 2009, com a instalação do Instituto da Família, para programas de pós-graduação academicamente reconhecidos como especialização, oferece-se um espectro ainda maior de cursos em diferentes áreas. A FTSA possui uma das mais completas estruturas físicas de escolas teológicas do país; uma biblioteca com 18 mil títulos e mais de 30 mil exemplares em seu acervo, exemplificam essa importância para alunos e pesquisadores.

O número de alunos também se multiplicou. Centenas já foram graduados e pós-graduados. Cerca de 30 denominações são representadas atualmente nos diferentes cursos da FTSA. Na pós-graduação, há alunos que são líderes denominacionais, líderes de ministérios importantes no meio evangélico ou protestante, refletindo desse modo os objetivos e a credibilidade que o Seminário e a Faculdade construíram ao longo do tempo. Hoje a Faculdade tornou-se referência de instituição não apenas interdenominacional, mas com representatividade majoritária em seu corpo discente de alunos e alunas pertencentes a denominações pentecostais e neopentecostais. Jorge Henrique Barro celebra esta diversidade confessional e aponta para expectativas de profundos impactos no contexto religioso brasileiro: “As maiores recompensas e alegrias nestes anos são ver tantos alunos entre nós. São os futuros líderes da igreja brasileira. Alguns já estão liderando a igreja brasileira. Outra grande recompensa que todos nós temos é de, por exemplo, ouvir histórias de vidas que foram transformadas por causa da instrução que foi recebida na Faculdade Teológica Sul Americana (…) Nossa alegria é a de ver a diferença que nossos alunos exercem sobre a vida das pessoas. Isso é uma recompensa muito grande. Outro aspecto, é ver os ministérios pastorais sendo transformados desde que um determinado aluno nosso lá chegou, proporcionando àquela comunidade, por exemplo, a visão da missão integral da igreja”.*

4. Teologia e missão em um espaço sem fronteiras

Atualmente, um outro alcance geográfico se delineia. Estudantes dos mais diversos lugares, por meio da modalidade de educação a distância, já devidamente autorizada pelo MEC, multiplicam o número de alunos, especialmente da América Latina e do continente africano, que já se graduaram nos cursos presenciais da FTSA ao longo de 20 anos. A realidade do ambiente virtual do ensino a distância assegura uma educação sem fronteiras, escrevendo assim um novo e simbólico capítulo na história da terceira década que se inicia. A missão, desse modo, literalmente atinge “os confins da terra” (At 1:8); e o tempo revela a resposta da primeira oração feita no local onde está instalado o campus da FTSA, proferida pelo Rev. Messias Anacleto Rosa, no dia em que se deu a compra desse espaço: “Que aqui se construa um grande seminário e que daqui saiam homens e mulheres para abençoar o mundo”.*

É importante observar que os espaços anteriormente percorridos permanecem como balizas ou parâmetros nessa história que adentra a uma terceira década. Por exemplo, a FTSA hoje abriga em suas instalações o Colégio PGD (Para a Glória de Deus), com ensino fundamental e médio, o qual utiliza no período diurno as salas de aulas e boa parte do espaço externo. No convívio com o PGD a FTSA reencontra suas origens e revisita um tempo em que também compartilhou ambientes com as novas e futuras gerações do país. A caminhada em proximidade com a igreja é outra marca. Além da presença de centenas de pastores, provenientes das mais diferentes regiões do país, que anualmente frequentam as instalações da Faculdade para finalização de seu curso de Teologia com reconhecimento do MEC ou para cursos de pós-graduação, a Instituição também oferece programas de ensino voltados às lideranças leigas, além de inserir seus estudantes no dia a dia da vivência da igreja por meios dos estágios curriculares obrigatórios previstos na realização do curso. Outro aspecto é que, na tradição do protestantismo, a Teologia nunca esteve divorciada das outras áreas do saber; ao contrário, quando da criação, por exemplo, do primeiro seminário por João Calvino, em Genebra, na Suíça, no calor da Reforma Protestante do século XVI, a Teologia compartilhava espaço com outras carreiras acadêmicas, pois se postulava ali que a vocação divina se manifesta em todas as profissões que estejam a serviço da vida, do bem, do direito e da justiça. Fé e razão; espiritualidade e ciência; missão e contextualização, são assim valorizados como elementos indissociáveis. Com isso, a FTSA consolida um claro perfil identitário: avançar e inovar sempre, sem contudo abrir mão de princípios e valores construídos ao longo de 20 anos de história, cuja síntese se traduz em seu slogan de “preparar vidas para servir o reino de Deus”.

* Extraído de: PROENÇA, Wander de Lara (org.). Faculdade Teológica Sul Americana. Panorama histórico dos 10 anos da FTSA. Londrina: Descoberta, 1994.